No Teatro do Oprimido, uma das técnicas mais conhecidas se chama Cena Forúm. Na Cena Forúm apresentamos um problema, nossa ou nosso protagonista tem um objetivo claro, mas não consegue alcança-lo e fracassa. Na sequência convidamos a plateia a entrar em cena no lugar da protagonista e tentar alternativas para que o personagem seja bem sucedido , isso é alcance seu objetivo. Para Boal, ao fazermos uma cena fórum estamos ensaiando para vida. E saímos da qualidade de espectadores para espec-atores. Temos o convite de levantar da cadeira e fazer algo ativo onde nos cabe ser ativo, na nossa vida alcançando nossos objetivos.
Para chegarmos em uma cena do grupo, os participantes da oficina modulo II da Comunidade de São Sebastião foram convidados a relembrar momentos de suas vidas, em que tinham um objetivo claro, mas que por algum motivo fracassaram. Em seguida definimos juntos o relato que mais representava o grupo, ou seja, a história o que apesar de ser de uma pessoa específica era um problema comum a grande maioria da turma.
Escolhemos então contar a história da Garota da Biblioteca. Sua história resumidamente, era a seguinte:
Ela era aluna do ensino médio e estava estudando para o PAS. Ia sempre à biblioteca perto de sua casa para estudar para essa prova. Num determinado dia um homem, começou a assedia-la, tanto no caminho da biblioteca como dentro dela. Isso aconteceu algumas vezes até que ela desistiu de ir à biblioteca estudar. Fim.
O Objetivo da nossa protagonista era estudar, mas ela fracassou. Como ajudar essa protagonista a resolver seu problema?
Podemos pensar que é muito fácil resolver essa questão: contar a alguém. Denunciar. Etc
Mas será mesmo que é só contar a alguém? E quando falamos, será que somos ouvidas ou somos julgadas?
Após escolhermos a cena, me coloquei no lugar dessa protagonista, na minha vida. Quais lugares que gosto e preciso frequentar que hoje não me permito estar por medo de um opressor? As respostas foram vindo como bigornas na minha mente. Eu era aquela garota em muitos momentos da minha vida, deixei de falar o que pensava, deixei trabalhos que eu gostava, deixei de ser eu em muitos momentos da minha vida por achar que homens poderiam me assediar e em muitos momentos por assédio mesmo, ali, na lata. Por frases, por olhares que me despiram, por toques que me feriram. Como eu poderia dizer aquela garota “conte a alguém” “Denuncie” se eu mesma não falei, nem denunciei esses agressores.
Fizemos exercícios de cena fórum, com o tema do abuso. E colocamos no exercício, aluno a aluno como protagonistas dessa opressão. Víamos ali que algo acontecia, que uma opressão forte se instaurava naquela figura masculina. Num determinado momento, criamos uma rede de apoio à protagonista, fomos entrando em cena e a protegendo daquele olhar constrangedor, mostramos a garota da Biblioteca que ela já não estava sozinha ali. E assim conseguirmos empoderar essa protagonista.
Percebe?
Algo aí se movimenta quando narro isso a você?
Olhe ao redor. Muitas pessoas passam o mesmo que a garota da biblioteca e também acham que estão sozinhas. Na sua maioria mulheres. Então, se a minha experiência e/ ou esse texto fizer algum sentido para você, que tal a partir de hoje, você olhar ao redor e procurar garotas ou garotos assim e ajuda-los somente estando junto, somente se unindo, dizendo você não está sozinha. Não digo que essa è a Única forma, mas a forma encontrada naquele dia com aquela turma.
Então se valer a você, olhe ao redor, no ônibus, na rua, na escola, no trabalho. Ou comece por pessoas mais próximas, amigos, familiares. Enfim, aos poucos podemos quebrar nossos silêncios e denunciar nossas opressões, nos unindo.
Fico muito feliz de fazer parte desse movimento chamado Tear. E das sementes que ele planta nos alunos e em mim! Espero que deixe sementes em você também!
Com Amor,
Luciana Amaral
Patrocínio: FAC - Fundo de Apoio à Cultura do DF
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